Resgatando a
História Suburbana: O Matadouro da Penha!
A
dificuldade de resgatar a nossa história através de pesquisas em fontes
secundárias traz um pensamento crítico a nossa atual historiografia: Existe um
descaso gritante com a “cidade verdadeira”, a cidade do Pedro, do João, da
Maria, da Amanda, dos trabalhadores e moradores que se deslocam horas para
chegar ao trabalho.
A construção
do passado, a consulta a memória e a pesquisa em fonte secundárias e primárias
são partes essenciais do trabalho do historiador, assim como uma leitura
critica e imparcial.
Conforme a
cidade foi se expandido e crescendo, foi necessária a criação de locais de
matança e produção de animais para abastecer a cidade. Tivemos Matadouro em santa Cruz, Praça da
Bandeira, importantes centros de distribuição. Mas irei focar no Matadouro
esquecido por muitos, fonte de intrigas, problemas e fiscalizações, palco de
roubos e assassinatos, porém orgulho para o dono e moradores de Penha e Olaria.
Quincas
Leandro e Custódio Nunes
Antes de
falar do empreendimento, vamos falar um pouco sobre os homens responsáveis pela
criação, construção e crescimento do matadouro e sua relação com os bairros.
As terras, que hoje formam o bairro
de Ramos, pertenciam à família Fonseca Ramos, que cedeu uma faixa para colocar
o trem, mas com a condição de fazer uma estação para a família quando essa
viesse passar o fim de semana no sítio. Antes, era de São Francisco Xavier
direto até a Penha.
Ramos faz
parte de uma área montanhosa, atrás do Morro do Alemão, tem uma série de
serras, a serra da Misericórdia, por exemplo. Quando aconteceu o milagre de
Nossa Senhora da Penha, em 1634, o governador da época deu uma faixa de terra
para a Santa Casa de Misericórdia, que a abandonou.
Tem o Morro de Caricó e
outros que tem atrás do Morro do Alemão, que vão da Penha até Inhaúma. A área
do Morro do Alemão pertencia à família Ferreira Rego. Existe um documento que
mostra que ela comprou a área, assinado em 1821 e consta no Arquivo Nacional
que estas terras pertenceram a esta família desde os tempos do Império até
1910.
A fazenda da
família Rego era dedicada a criação de gado e a lavoura, mas logo perceberam
que as terras adquiridas eram férteis e o que se plantava , se colhia com
grande qualidade. Os integrantes da família também descobriram que parte de
suas terras possuíam um tipo de terra vermelha, ótima para fazer tijolos, então
pensando em expandir a localidade claro, visando o lucro, abriram várias
olarias na região para a venda dos mesmos. Com a ajuda de todos, Antônio João
Rêgo e Joaquim Rêgo prosperaram muito. Com o comércio lucrativo, outras olarias
de outros empreendedores foram surgindo e a região ficou conhecida como “Olarias”.
Mas não só
de cultivo, tijolos e gado viviam os Rêgos, seus descendentes fizeram parte de
suas riquezas como importantes comerciantes e funcionários públicos , sendo que
a mais importante pessoa da família foi a D. Leopoldina Rego ,que fundou , em
1900 , a primeira escola da região , onde hoje é a Rua professor Lacé que,
inclusive , pe seu primeiro diretor. A Escola hoje é conhecida como Padre
Manoel de Nobrega.
Joaquim Rego
morreu em 1896, sua viúva vendeu para o Joaquim Leandro da Mota (Quincas
Leandro) por 40 contos de réis, 440 mil metros quadrados. Pegava da Rua
Diomedes Trota até a Rua Antônio Rego, com frente para a Rua Uranos, o lote
tinha 880 metros, cobria o morro do Alemão, o morro do Coricó, Itararé, Itaoca.
E ele então urbanizou, abriu as ruas, colocou os nomes das famílias.
Um ato interessante
do Quincas foi noticiado no “Jornal do Brasil do ano de 1926”, onde é relatado
que ele sede um pedaço do terreno da invernada do corpo de Bombeiros de Olaria
para o uso do grupo de Escoteiros do Brasil, para as suas práticas.
Custódio Nunes era um típico comerciantes
leopoldinense que desejava expandir o seu comércio e seu dinheiro, queria ter
um negócio maior, algo que iria trazer um futuro financeiro estável. Ele possuía também algumas terras pelas
bandas de Ramos e Olaria e m 1892 conseguiu permissão do governo municipal uma
autorização para abater uns bois para comercializar alimentos frescos em seu
açougue.
Custódio
Nunes, como dono de algumas terras entre Ramos e Olaria, ajudou no crescimento
e loteamento do bairro, ele fez uma feitoria que até hoje está presente no
bairro: Ele doou o terreno para a construção da Igreja de São Geraldo, onde
fica o estádio do Olaria atualmente, já foi campo de guardar os bois. Ele abriu
a Rua Filomena Nunes ( filha dele). Ele também abriu a rua Dr. Nunes( seu
filho), a Rua Rosalina, Carlina e Noêmia Nunes.
O Matadouro
Custódio
Nunes, um próspero comerciante da zona da Leopoldina adquiriu um lote alugado
de terra na Penha, do lado da fazendinha e, em 1892, conseguiu uma permissão
junto a municipalidade para abater seis cabeças de bois por semana para ser
vendido em seu açougue ( segundo o jornal “O Paiz”, o matadouro existia desde
1897). Criou um pasto e ali começou a criar os primeiros bois. A cidade carioca
contava apenas com um matadouro oficial, que ficava em Santa Cruz, a carne era
encaminhada pelo trem até o frigorífico de São Diogo, que tinha como chefe o
senhor Quincas Leandro, que tinha adquirido algumas terras da família Rego.
Um dado
contraditório seria uma reportagem do jornal “ A CIDADE DO RIO”, de 30 de
dezembro de 1899, que mostra uma briga entre Custódio Nunes e a municipalidade.
O senhor Custódio teve problemas com a justiça, segundo o município , o pequeno
açougue não estava autorizado a matar os bois, apenas comercializar, alegaram
que o senhor Custódio não obedeceu ao contrato. Ou seja, essa fonte nos mostra
que o matadouro obteve autorização para matar os bois pós 1899 e não assim que
sua existência e tornou oficial em 1892.
curral -1913 |
A permissão
temporária foi estendida para os anos a frente, o que permitiu o crescimento do
número de cabeças de gado e a frota de carroças para transporte. Essa expansão
possibilitou também averba necessária para Custódio comprar uma boa parte da
grande fazenda da Penha, essa área foi destinada para campo da boiada e o local
ficou conhecido como “Invernada de Olaria”, que anos mais a gente, frequentou
muito as páginas policiais, tornando-se um local perigoso e de domínio da
bandidagem.
Em 1902, o
então dono prospero Custódio ,vendo seus negócios em expansão , percebeu que
precisava de um sócio capacitado que pudesse ajuda-lo a transformar o modesto
matadouro , no líder de distribuição de carne bovina, foi por esse motivo , ele
convida o chefe o frigorífico de são Diogo , Quincas Leandro para comandar os
trabalhos. Ambos ficam ricos com o negócio e começam a adquirir terras em volta
para aumentar ainda mais os negócios e a renda. Quando Custódio morreu em
1916,Quincas chama para se associar o Capitão Goulart e assim criaram os “
Irmãos Goulart S.A .
Além em
empresa, a Goulart S.A teve um time de futebol amador, era o time de
funcionários da empresa, jogavam todos os sábados com os moradores locais. O
terreno de treino ficava na rua Bariri e pertencia a Dona Noemia Nunes, filha
de Custódio , que mais tarde doaria as terras para a construção da sede
administrativa e esportiva do Olaria.
Escudo do time |
O time
Goulart teve um grande momento, apesar de ser um time amador, o time do
Matadouro teve a honra de conquistar o Campeonato do Departamento Autônomo de
1956, campeonato amador da federação carioca. O time foi criado em 1916, mas
foi registrado oficialmente para participar das competições a partir de 1932.
O terreno do
Matadouro ficou enorme, procure imaginar algo que pegasse todos os prédios do
atual IAPI, o campo do Olaria até atrás do mercado extra, metade até o caminho
de Ramos , realmente foi um local enorme .
O crime da
Fera
O texto é de
autoria exclusiva da página, por ser um conteúdo completo sobre o assunto,
resolvi anexar no meu texto, dando o devido crédito.
“Era a manhã de um feio e frio dia 30
de junho. As pessoas se movimentavam rumo ao trabalho, e a cidade estava
despertada há muito, exatamente como toda metrópole que se preze. As pessoas
que trabalhavam ou no próprio local, ou nas imediações do matadouro do bairro
da Penha, já se encontravam em seus postos e já tinham iniciado suas atividades
quando gritos e correrias começaram a chamar a atenção de todos. Ninguém
entendia o que estava se passando, mas, quase todo o mundo deixava seus
afazeres para saber o que efetivamente acontecia. Até que tudo começou a ficar
mais claro. Chocada, a maioria das pessoas próximas ao local foi informada de
que, em um terreno baldio, ali pertinho, fora encontrado o corpo de uma
criança, ainda sem sexo definido, todo queimado e irreconhecível. A brutalidade
da cena chocou até os homens mais rudes acostumados com a matança de animais no
abatedouro do bairro, ninguém entendendo como podia ter acontecido uma
barbaridade daquela, com uma criança que aparentava, talvez, cinco anos. Logo
se saberia, porém, que a criança era um garota de quatro anos, que seu nome era
Tânia Maria e que, antes de ter seu corpo incendiado, levara um tiro à
queima-roupa na cabeça.
O triste acontecimento se torna um
prato cheio para a imprensa. A notícia chegou à população em grandes e
dramáticas manchetes, dividindo os noticiários com as eleições de outubro
próximo, com a escolha da “Miss Brasil” de 1960, ainda com o caso Aída Curi,
com o Crime do Sacopã e com uma estranha história que dava conta de que o mundo
iria se acabar no dia 14 de julho próximo. O drama real do assassinato da
garota virou uma tragédia, daquelas que sempre povoavam o mundo de Nelson
Rodrigues.
Assim que acionada, a polícia não
teve muitas dificuldades de chegar ao assassino. À assassina, na realidade. Seu
nome, Neide Maria Lopes, idade, 22 anos, estado civil, solteira, profissão,
comerciária, motivação do crime: ciúme e vingança. Logo, em menos de vinte e
quatro horas, toda a imprensa noticiava a prisão e confissão de Neide, a partir
de então conhecida como “Frankenstein de Saia”, “Mulher-Fera”, “Besta-Humana”
e, posteriormente, pelo cognome que mais colou à sua figura, “A Fera da Penha”.
Neide Maria, solitária e recatada,
conheceu Antônio, motorista de profissão, em uma estação de trem; o rapaz, em
pouco tempo de conversa, percebe que aquela moça tímida era uma presa fácil,
iniciando, ali, um romance daqueles típicos do início da década de sessenta.
Neide estava esperançosa de terminar seus dias solitários, já que Antônio, além
de educado, lhe pareceu uma pessoa honesta, digna de confiança. Tornam-se
amantes, mas com promessa de casamento, assim que as condições o permitissem.
Até que a dura realidade abriu seus
olhos: após cerca de três meses de namoro, encontrando-se, praticamente, todos
os dias, ela descobre que Antônio lhe escondia o fato de que, além de casado
com uma mulher de nome Nilze, ainda tinha duas filhas pequenas. Nessa época,
namorar um homem casado era fatal para qualquer garota, principalmente quando o
fato era descoberto por amigos e vizinhos. Seu nome “caía na boca do povo”,
conforme se dizia.
A descoberta desse fato despertou-lhe
os mais baixos instintos humanos; sentiu-se traída pelo homem em quem confiava,
além de jogar por terra todos os seus sonhos de ter um bom homem ao seu lado
por toda a vida. Resolveu colocar Antônio na parede: ou a família ou ela. Sem
discussão.
Só que Antônio foi empurrando o caso
com a barriga, prometendo, ao longo dos meses, que iria abandonar a mulher, que
não aguentava mais, que tudo era uma questão de tempo, que havia o problema das
crianças, que ela tivesse paciência e assim por diante. Nada ignorante, Neide
logo ficou convicta de que seu namorado nunca iria abandonar sua família, que
seus sonhos nunca se realizariam. Sua ira começou a se transformar em uma forte
convicção: iria se vingar da afronta de Antônio de uma forma que ele, ao longo
de sua vida, nunca mais esqueceria.
Seu primeiro passo foi se aproximar
da família do namorado. Conseguiu enganar Nilza, dizendo-se ser uma antiga
amiga do colégio, ganhando sua confiança e começando a freqüentar sua casa. Sua
educação e boas maneiras conquistaram Nilza, as duas iniciando uma relação de
amizade. Sabendo pela rival que Tânia Maria era o xodó do pai, imediatamente se
convenceu de que a menina seria o alvo de sua vingança. O destino da garotinha
ficou, assim, determinado.
Conhecendo a rotina da casa do
amante, principalmente os horários em que as duas garotas iam e vinham do
colégio onde estudavam, ela bolou um plano diabólico: fazendo-se passar por
Nilza, Neide telefonou para a escola, dizendo que Tânia teria que voltar mais
cedo para casa e que uma vizinha iria passar por lá para pegar a garota. O
pessoal da escola de nada desconfiou, e Neide saiu com Tânia aparentemente
despreocupada. Qual não foi a surpresa de Nilza, sua dor, ao ser informada,
mais tarde, quando levara o lanche da garotinha, de que Tânia não se encontrava
por lá, que saíra mais cedo exatamente como ela havia pedido ao telefone.
Reconheceu as feições de Neide conforme descritas pelo pessoal da escola.
Em desespero, entra em contato com o
marido, contando-lhe, angustiada, sobre o acontecido. Antônio, na mesma hora,
ficou convicto da participação da namorada, mas, como ela sempre se mostrara
cordial, não obstante suas cobranças para que ele abandonasse a família, pensou
em muita coisa, menos na possibilidade de que ela pudesse fazer algum mal à sua
filha.
No entanto, Neide tinha as mais
macabras das intenções; levou a garota para diversos locais, inclusive para a
casa de uma amiga, ao mesmo tempo em que adquiriu uma garrafa de álcool em uma
farmácia por onde passara. Em casa, Antônio e Nilza aguardavam, aflitos, algum
contato de Neide ou mesmo alguma notícia da filha desaparecida. A chegada da
noite deixou o casal mais angustiado, agora desconfiado e temeroso de que algo
de muito ruim poderia ter acontecido. Às oito e meia da noite, Neide decidiu
que Tânia Maria tinha que ser sacrificada.
Inflexivelmente, dirigiu-se ao local
acima descrito, sabendo que, àquela hora, ele estaria completamente deserto, e,
sem dó nem piedade, agarra o revólver, mira a cabeça da garota, dá-lhe um tiro,
após o qual, pega a garrafa de álcool, despeja o líquido sobre o corpo
estendido no chão e lhe ateia fogo. Logo abandona o local, dirigindo-se para
sua casa.
As investigações policiais, a cargo
do delegado Olavo Campos Pinto, do 24º Distrito Policial, não tiveram muita
dificuldade em chegar até Neide, porquanto ela deixara enormes rastros por onde
passara. Com uma frieza que impressionou a todos, já que era evidente sua culpa
no episódio, negou firmemente as acusações em interrogatório que ultrapassou as
doze horas. Negava e negava; protestava inocência, dizendo-se perseguida pelas
acusações de Antônio, só porque tivera um caso com ele. Ela só ficou abalada
quando confrontada com o revólver utilizado para a perpetração do nefando
crime. Olavo Campos, mostrando-lhe a arma, já confirmada ser de sua
propriedade, diz a Neide que, se o revólver era dela, somente ela poderia ter
praticado o bárbaro ato, porque, além de ter os motivos para tal, ela não tinha
álibi para confirmar sua não participação no episódio. Mas ela se negava a
tirar a máscara de sua face, dava pistas falsas, chegando a perguntar ao
delegado por que tinha que ser ela a assassina e não outra qualquer. Este teve
que lhe explicar que um revólver tem raias dentro do cano e que, quando uma
pessoa atira, a bala sai girando e o projétil apresenta as marcas das raias do
cano. Também, lhe foi mostrado o laudo que confirmava ser de seu revólver a
bala assassina.
Dessa forma, com argumentos e
convicção, Olavo Campos foi minando as resistências de Neide, até que, em uma
crise de choro, ela confessa todos os detalhes do crime e de sua preparação,
seu choro se tornando convulsivo, em um misto de culpa e resignação.
A imprensa, assim que Neide confessou
sua culpa, fez seu carnaval de sempre, cada órgão se esmerando em escolher as
manchetes mais apelativas. Mas o epíteto que mais pegou, e que ficou até os
dias de hoje foi mesmo “Fera da Penha”.
Quando a imprensa noticiou que a
reconstituição do crime seria realizada com a presença da assassina, centenas
de pessoas se dirigiram ao local do crime, dezenas de piedosas mulheres,
daquelas que vão à missa todos os fins de semana e pedem proteção a Deus contra
as maldades do mundo, ficaram de prontidão no local, esperando a chegada de
Neide exigindo justiça e prontas para linchá-la, a maioria com esperança de
poderem fazer justiça com as próprias mãos se a reconstituição viesse mesmo a
ser realizada. As próprias detentas de Penitenciária de Mulheres de Bangu,
algumas com crimes tão perversos quanto o de Neide, revoltadas, ameaçaram
matá-la e também fazer justiça. Segundo elas, era verdade que cometeram crimes
terríveis, Porém o de Neide teria ultrapassado todos os limites. A morte seria
pouco para ela.
E não demoraria muito, a quase
totalidade da imprensa, como sempre acontecia quando um crime cuja barbaridade
excedia aos limites do aceitável, estava discutindo a adoção no país da pena de
morte. A santificação de Tânia Maria, assim como aconteceu no caso Aída Curi,
se espalhou por todo o Rio de Janeiro. A imprensa, principalmente a revista O
Cruzeiro, que se julgava a guardiã da moral e dos bons costumes, mas, que se
aproveitava das desgraças do cotidiano para ser a líder de vendas entre as
revistas brasileiras com suas reportagens sensacionalistas, se encarrega desse
mister.
Na edição de 30 de junho de 1960 da
revista O Cruzeiro, o famoso repórter policial Arlindo Silva deixaria para a
posteridade a matéria cognominada “Tânia Maria é agora menina santa”, explicando
aos leitores de todo o Brasil o que estava acontecendo com o local onde o crime
foi perpetrado, como para lembrar a todos que o crime não poderia ser
esquecido:
“Dizem que a memória do povo é fraca, mas o caso do assassino da menina
Tânia Maria, pelo Frankenstein de saias, Neide Maia Lopes, duvido que o povo
esqueça. O local onde a garotinha foi morta, um terreno baldio junto ao
matadouro da Penha (Rio de Janeiro), está convertido num pequeno santuário,
onde, diariamente, milhares de pessoas fazem preces, levam flores, acendem
velas e pedem graças. O pequeno pedaço de chão onde a criança morreu queimada,
após levar tiro na cabeça, foi cercado por barras de ferro, imitando um pequeno
berço, por um popular anônimo. No dia seguinte à morte de Tânia, já se erguia
no local uma cruz branca, e, desde então, a peregrinação não cessou. Começa de
manhã e vai até altas horas da noite. Senhoras, moradoras nas imediações,
contam que cerca de 1.000 pessoas por dia, muitas vindas de longe ou em
trânsito pelas rodovias Rio-São Paulo e Rio-Petrópolis, vão até o local onde
morreu a “Flor do Campo”. Este é o nome que poetas desconhecidos deram à pobre
menina. À cruz estão pregados poemas de louvor e glorificação à pequena vítima.
Esses poemas falam: “Ó Santa menina - O mundo não era teu - Tu foste
predestinada - Para a glória do céu”. Também foi pregado à cruzinha branca o
“Hino à Flor do Campo”, com estrofes assim: “Ó menina imaculada - Ó meu anjo
salvador - Aqui, aqui te louvamos - Com a nossa imensa dor”. Continua: “Vamos
todos para o campo - Lá morreu a nossa flor - Aqui, aqui te ofertamos - Todo
nosso grande amor”. E o Hino termina: “Este campo consagrado - É da filha do
Senhor - Aqui, aqui nós rezamos - Ó meu anjo salvador”. Em volta do pequeno
carneiro improvisado, oram, ajoelhadas, mulheres idosas, mocinhas e crianças,
como se estivessem ante um altar. Velhas mães, não contendo sua indignação,
dizem que a Polícia deveria deixar a mulher-fera nas mãos do povo.”
O julgamento de Neide - exatamente
como acontece com todos os crimes de grande repercussão - se tornou uma arena
de circo, cada jornal ou revista trazendo reportagens com mais adjetivos do que
substantivos. O Resultado foi o esperado: “A Fera da Penha” foi condenada a 33
anos de prisão, saindo, ainda jovem da prisão, por bom comportamento, após
cumprir 15. Nunca abriu boca para comentar a respeito de seu crime, nem logo
após os acontecimentos, nem depois que deixou a prisão. Antes do crime, levava
uma vida pacata, sem maiores sobressaltos. Depois do crime, levou uma vida
incógnita, pacata, sem sobressaltos e se dedicou a trabalhos filantrópicos.
Está viva, bem, e mora no Rio de Janeiro.”
O Matadouro
sempre esteve presente nos anais dos periódicos cariocas. Sendo por notícias
boas ou ruins, os noticiários diários sempre noticiavam algo em relação ao
velho e querido matadouro. Vamos explorar algumas das milhares notícias.
Jornal “A NOTÌCIA” – 1900
Entre os
anos de 1900 e 1910, houve uma intensa briga entre a prefeitura e o Matadouro.
O desejo da municipalidade era comandar todos os matadouros da cidade ( Santa
Cruz, Penha e Praça da Bandeira) , e claro que o donos das mesmas não desejavam
ver seu negócio fluir pelos seus dedos. Os Donos do Matadouro da Penha
decidiram fechar o matadouro até que o problema se resolvesse, isso gerou uma
revolta da população local, onde foram registrados protestos e quebra-quebra em
favor do matadouro.
Jornal “O Radical“ -1932
Esse
incrível periódico noticiava saída de trens de vários lugares do estado do
Rio e de outros estados, levando bois
para o abate. Os trens saiam de locais como Deodoro, Floriano e Cruzeiro.
Jornal ”Tribuna de Imprensa”- 8 de
abril de 1960
È noticiado
a missa de 7 dia pela morte da viúva do fundador do Matadouro , d. Maria
Alexandrina Linhares Goulart. Toda a comunidade é convidada para prestigiar a
ilustre leopoldinense.
Periódico ”Anuário do Jornal do
Brasil” : anos de 1920 a 1930
Durante esse
período, era comum o matadouro divulgar relatório de quantos bois foram abatidos
durante toda a temporada, já nessa época, o número de abates já era expressivo:
1924- 30.275
bois
1925-31.637
bois
1930-36.331
bois
Acidentes
estranhos já foram registrados no Matadouro, o mais “exótico” foi a queda de um
avião no campo aonde ficavam os bois, ninguém se feriu gravemente e nenhum boi
teve seu destino selado antes do tempo: “ A Nação 1934”.
Outro
acidente ou incidente foi quando um boi fugiu e foi parar no centro da cidade,
causando pânico e terror. ( A Noite- 1954).
“ O Imparcial” 30 de novembro de 1922
O governo
descobre sonegação de impostos por parte do Matadouro, por dia não são lançados
nos registros 22 bois, 9 porcos e 4 vitellos.
“ O Imparcial “ 1929
Matadouro
recebe criticas da população e da municipalidade devido à falta de cuidado com
o manuseio das carnes.
“Jornal do Brasil”-1889
O matadouro
foi fechado pela fiscalização por vender “ Carne Verde”( estragada) e estava
funcionando sem a autorização do Município , o que reforça a tese que o
Matadouro só conseguiu a autorização pós 1899 mais a prática de matar já
existia quando açougue foi adquirido , antes de 1892, segundo a data do jornal
,um açougue e um pequeno matadouro já existia antes da possível data da
inauguração.
Outras
notícias habitaram os noticiários jornalísticos:
“Jornal dos Sports “ 14 de junho de 1949
O Olaria
pagou pela faixa de terreno que pertencia ao Matadouro para ampliação de seu
estádio, porém a prefeitura precisa autorizar a compra e a construção do local.
Cada
história está interligada aos fatos e esses mesmos são processos históricos que
se ligam a historiografia suburbana. Como a o Matadouro da Penha poderia estar
ligado ao Clube de futebol do Olaria ? No ano de 1949, a presidência do Olaria
pretendia ampliar as instalações do estádio e transformar o clube numa grande
praça de esportes.
As fotos
abaixo mostram o plano do projeto e uma parte que teria que ser adquirida, pois
essa parte de tamanho de 20 metros, adentrava o terreno do matadouro da Penha, vejam
como era enorme o terreno, que chegava bem perto do estádio .
A segunda
foto é uma placa indicando a construção do estádio e a terceira foto mostra
como era o estádio antes da grande ampliação.
Graças a
atuação de pessoas de influência como Álvaro da Costa Mello, Rui Campista entre
outros, o Olaria conseguiu adquirir essa parte do terreno e ampliar as
instalações
“ A Noite” 1931
Moradores da
Penha reclamam das condições do desembarque de bois na região, reclamavam de
fugas, chifradas e problemas das sujeiras provocadas pelos bois.
“Jornal dos Sports” – 1948
O jornal fez
elogios ao maquinário e como a produção no abate dos animais era bem feito, com
técnicas modernas. As carnes eram divididas em caixas de metal, levadas até a
Estação Pedro Ernesto ( Olaria) e lá desembarcava num entreposto , conservado até
os caminhões pudessem buscar para a distribuição para açougues da cidade.
Os anos de
1913 e 1912 foram bem agitados, assaltos ao açougue e acusação de gado doente
para a população. A fiscalização bate no matadouro e constata:
Nenhum
cuidado e nem “piedade” no abate dos bois,
Curral sujo,
fedorento e mal limpo,
Carne
pendurada e exposta as moscas.
O jornal “A NOITE” de 14 de junho de 1961, uma
das caldeiras explodiu devido a um defeito na auto-clave ( manutenção ), o
chefe da seção que estava manuseando o aparelho morreu na hora. Outros
funcionários também saíram feridos sem gravidade.
Conclusão
De pequeno
açougue a grande indústria, o Matadouro representou a Leopoldina, contou a
história de milhares de trabalhadores, construiu o caminho de um dos clubes mais tradicionais
do Rio, emocionou e marcou gerações de pessoas que lembram com orgulho o maior
empreendimento da Leopoldina.
O Matadouro
já não existe mais, porém estará sempre em nossos corações , memórias e em
nossa escrita.
Bibliografia
Páginas no facebook : Memória do subúrbio carioca
Jornais
Antigos
Penha da Depressão
Páginas internet: https://decadade50.blogspot.com/2006/09/o-crime-da-fera-da-penha.html
cacellain.com.br
www.flickr.com
Livros : Freguesias do Rio Antigo
Ruas do Rio
Evolução Urbana da cidade do Rio
de Janeiro
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