terça-feira, 20 de agosto de 2019

UM PROBLEMA CHAMADO CORDOVIL.



 O bairro de Cordovil tornou-se um grande problema para a municipalidade e para o Estado. Nos anos 90, a cidade Alta era uma comunidade considerada tranquila, sem muitos problemas ou tensões devido a invasões, tinha seus problemas, mas no geral era tranquila. Seus moradores gostavam do clima e conviviam bem com os problemas.

De 2016 para cá, a comunidade vem sofrendo com invasões e problemas com tiroteios e troca de facções. O bairro, consequentemente, sofre com inúmeros assaltos e falta de uma estrutura descente de vida. Mas esses problemas sociais, o bairro carrega desde seu nascimento. 

https://odia.ig.com.br/rio-de-janeiro/2018/07/5554485-moradores-relatam-intenso-tiroteio-na-cidade-alta.html

Antes fazenda, o bairro foi loteado para que pessoas de classe médias baixas pudessem comprar seus terrenos e ali, construíssem seus bens e populariza-se a nova região. Porém, como boa arte do subúrbio, o local foi loteado, terrenos vendidos e sem a menor estrutura física para comportar os moradores. Problemas de falta de água, luz, transportes e segurança sempre foram uma constante no bairro

1926- reportagem mostrando os problemas gerais do bairro .




Para entender esse processo convido a todos voltarmos no tempo, na formação do novo centro da cidade, a grande reforma promovida por Pereira Passos.

No livro “Evolução Urbana” Mauricio de Abreu ele mostra todos os processos de evolução urbana da cidade, mostrando inúmeros fatores que proporcionaram as obras de melhorias do centro e o afastamento dos pobres para a Zona Rural carioca. O governo carioca sempre esteve ao lado das elites, e o desejo das mesmas sempre foram estar próximos ao centro nervoso e econômico da cidade, o que poderíamos pensar que, uma massa pobre e trabalhadores incomodaria e impossibilitaria a existência de ambos no mesmo loca.

O modelo americano não foi implantado na cidade, modelo esse que seguia regras bem rígidas, regras essas que os ricos são levados para as periferias e a massa trabalhadora fica perto dos centros econômicos, possibilitando assim a economia de passagens e moradias, e os mais ricos ficariam longe das confusões e de contato constante com os operários. Já na cidade maravilhosa, isso foi bem diferente, no nosso caso o núcleo da cidade é o local mais importante da mesma, ela é uma região mais valorizada, e as periferias apresentavam uma escassez de recursos e lugares descentes para as elites, devido a isso, um trabalho em conjunto entre Pereira Passos e as elites, promoveram um êxodo em direção a lugares como Cordovil, Brás de Pina, Ramos, entre outros.

 "Depois do Golpe de 1889 o Rio de Janeiro vai experimentar uma grande evolução urbana, locais até então consideradas zonas rurais vão aos poucos sendo incorporada a cidade, sendo iniciado um processo de urbanização que vai trazer muitas pessoas para regiões inóspitas. Quando falamos de bairros como Cordovil, Brás de Pina entre outros, devemos atribuir seu surgimento principalmente aos trens, pois a necessidade de lotear esses terrenos era urgente, pois o processo urbano da cidade influenciado pelo capitalismo viu que o pobre não deveria ter lugar no centro e nos bairros emergentes, que para a cidade evoluir, era necessário realizar uma obra de urbanização onde o pobre fosse afastado do lugar de trabalho, já que com a nova visão de cidade, o custo de vida do centro seria muito maior. A estrutura do espaço das novas cidades tem muito a ver com os conflitos entre classes, a luta pelo domínio territorial, elitizar uma zona em detrimento a outra, e como o governo recém-posto no poder apoiava os planos das elites, foi o ambiente perfeito para a separação social definitiva.( Paulo, 2016).

“A estrutura espacial de uma cidade capitalista não pode ser não pode ser dissociada das práticas sociais e dos conflitos existentes entre as classes urbanas. Com efeito, a luta de classes também se reflete na luta pelo domínio do espaço, marcando a forma de ocupação de solo urbano. Por outro lado, a recíproca é verdadeira: nas classes capitalistas, a forma de organização do espaço tende a organizar e assegurar a concentração de renda e de poder na mão de poucos, realimentando os conflitos de classes” (ABREU,2013,p.15).

Esse novo patrão de cidade divide o terreno em núcleo e as periferias, onde esse núcleo concentra as funções centrais (econômica, administrativa, financeira, políticas e culturais) e a periferia concentrando as famílias de classe média baixa. Foi nessa conjuntura que a família Cordovil viu a oportunidade de ganhar um dinheiro vendendo em definitivo suas terras para Visconde de Moraes (1848-1931).

O velho visconde promove a venda de terrenos e o local foi crescendo, as pessoas eram atraídas pela calmaria do lugar, um morro com um pequeno lago, uma praia próxima e um grande rio que fornecia peixe a vontade para os primeiros moradores. Mas o que os moradores não esperavam era o completo abandono do poder público.




Água, luz, segurança e estradas, nada disso o bairro possuía e, segundo os antigos, isso demorou muito a chegar, inclusive isso é constatado nas reportagens dos jornais de época. As primeiras reportagens eram bem comuns ver assaltos, pessoas invadindo casas e suicídios na linha do trem. Logo depois vemos o problema que persistiu no bairro durante 20 anos (no mínimo).






A grande reclamação dos moradores era a falta d’água. Mas isso não fazia o menor sentido pois o reservatório da Penha, inaugurado em 1914 estava numa distância pequena e seria o suficiente para abastecer o pequeno povoado. Sendo que fiz uma pesquisa para descobrir o porquê da falta de água com um reservatório tão perto e descobri que em 1920, devido a um erro humano, houve muita pressão na tubulação que levava água até o bairro e a mesma estourou, o concerto, pasmem os senhores, levou vinte anos para ser concertado, nesse período, pouquíssima água chegava até o local, sendo necessário o uso das famosas bicas públicas para o abastecimento de água.

Apensar de alguns periódicos mostrarem alguns melhoramentos no bairro, os antigos sempre falam que o bairro, apesar de lindo, sofria de carência de tudo e sua população se sentia cada vez mais abandonada. Alguns relatos de visita de políticos, melhorias aconteceram mais não foi o suficiente para tornar um bairro mais agradável.






 O bairro hoje, nada mais é que o resultado do processo histórico, algo que se arrasta lá do passado, que vem piorando a cada mês que se passa. Os moradores e esse historiador que vos escreve, espera que o bairro consiga, em algum dia, ser o tão sonhado bairro para sua população trabalhadora.

1918- decreto municipal oficializando as ruas de Cordovil, isso iria trazer melhorias para o bairro.

Horários dos trens em Cordovil


Com a falta de água, foi necessário a inauguração de bicas públicas. Essa ficava onde hoje está a escada da estação de trem .


 Foto doada pelo Tiago Bandeira, fundador da página Memória do Subúrbio Carioca e Jornais Antigos 




Nenhum comentário:

Postar um comentário